Tenho acompanhado a fortíssima reação da classe artística à Lei de Incentivo ao Esporte, que foi aprovada na Câmara dos Deputados e tramita no Senado.
À primeira vista, a Lei parece prejudicar um pouco a cultura, pois ocupa o mesmo espaço (o teto de doações será compartilhado entre esporte e cultura, além de atingirem o mesmo universo de empresas) e dá ao esporte uma certa vantagem, pois o patrocinador pode deduzir do IR 100% do que patrocinar (na cultura, em média se pode deduzir 30%). E a área de cultura ainda reclama que projetos esportivos têm mais visibilidade. Tenho lá minhas dúvidas.
Mas as críticas não levam em conta alguns detalhes. Nem todas as empresas elegíveis para fazer doação (apenas as que declaram IR sobre o lucro real, o que corresponde a aproximadamente 7% das empresas no Brasil, ou seja, cerca de 2.000 empresas) patrocinam alguma atividade. Além disso, as que patrocinam nem sempre atingem o teto. Ou seja, ainda há uma margem grande para ser aproveitada.
O que mais me preocupou foi o preconceito e desconhecimento demonstrado por algumas pessoas importantes e pela mídia.
No jornal O Globo, de sábado (09/12/2006), as declarações da atriz Fernanda Montenegro foram bastante preconceituosas. Em um trecho, ela diz: "Sem falar que, do jeito que a lei está, pode ser qualquer esporte: golfe, pingue-pongue, botão... É uma atitude golpista". Só para exemplificar, golfe é esporte sim, movimenta milhões de dólares por ano e já tem projetos sociais no Brasil. Com incentivo, o golfe pode crescer e ainda trazer esses milhões de dólares para cá. É uma pena ler isso de uma pessoa de quem se esperava muito mais.
Na opinião do jornal ("Para a gaveta"), em que defende a rejeição do projeto no Senado, ele diz: "Porque tende a reduzir o número de empresas - já menos de duas mil - que financiam a cultura, assim como a verba, já curta, que destinam a essa área". Já mencionei acima que ainda há margem para mais patrocínios.
Em outro trecho, o jornal diz: "Porque institui benefícios para um setor que já tem seus patrocinadores". Em que país? Quantos atletas têm patrocínio? Quantas equipes têm patrocínio? Quantos projetos têm patrocínio? O jornal deve estar iludido com os principais clubes de futebol, alguns de vôlei e basquete, alguns atletas de ponta. Mas a grande massa sofre muito para sobreviver.
No final, o jornal ainda diz: "E porque não leva em conta que há, em alguns ramos dos esportes, muitos personagens que estão longe de se destacar pelo comportamento ético indispensável no trato de questões relativas a dinheiro, seja público ou privado". Ora, por causa de uma minoria, o jornal julga os demais? Por causa de algumas pessoas sem ética os demais ficam prejudicados? Logo os que mais necessitam? Será que ele esquece que em todos os setores da sociedade pode haver pessoas desonestas? Isto invalidaria a sociedade inteira? Então porque invalidar a lei? Lamentável.
Outra coisa que muito me irrita aqui no Brasil. Ao invés de lutarem para que a Lei de Incentivo à Cultura (Lei Rouanet) seja aprimorada para que tenha os mesmos benefícios do esporte, querem lutar para piorar a Lei de Incentivo ao Esporte. A velha mediocridade brasileira. É mais fácil denegrir o outro do que se esforçar para ser melhor que ele.
Ainda acho que a Lei (na verdade, as duas) deveriam ser ampliadas para abranger os outros 93% de empresas (as que declaram IR pelo lucro presumido), talvez com teto diferenciado ou limite de isenção diferenciado.
E poderia haver projetos em conjunto, se beneficiando das duas Leis. Afinal, há muitos projetos sociais envolvendo cultura e esporte, que na minha opinião são ligados.
2 comentários:
Nagato,
Muito bom. Sugiro enviar este texto a algum jornal com boa circulação. Vale tentar.
Abraços,
Pina
Nagato,
Boa sua argumentação... infelizmente nossos "artistas" têm um raciocínio curto curto...
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